terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Lembrança em AÇÃO ! ROSA MARIA DAOLIO

 Assistindo a live de Maria Bethânia , hoje dia 14/02/2021, ela  a declamar " menino Jesus " de  Fernando Pessoa como Alberto Caeiro, eu lembrei do Show Rosas do Vento, que na vitrola rodava o Long play, e o quarto do meu irmão era meu refugio pra ouvir e repetir , guardo a lembrança de um  tempo que em mim a esperança brotava, mesmo com os riscos que corriam à carne minha, adolescente.


Poema do Menino Jesus

Num meio-dia de fim de Primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu tudo era falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas -
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque nem era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E que nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o Sol
E desceu no primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão 
E olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar para o chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou -
"Se é que ele as criou, do que duvido." -
"Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres."
E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.

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Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo o universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
E ele sorri porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do Sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos dos muros caiados.

Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.

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Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.

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Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam ?

                          Alberto Caeiro 

Nos  dias  seguintes descobri uma forma de fé alucinante com o menino que também dormiu comigo,entrou nos meus sonhos, de manhã rodou pião , bola ao sexto , conquistou meninas pra brincar de casinha conosco.
Furtei daquele momento descobertas criveis, mesmo as escondidas a ler histórias parecidas com a minha, outras saídas para as paixões impossíveis  que me  escapariam e  que as visões escolhem ser verdadeiras.
De lá pra cá a vida virou de ponta cabeça, contudo  meu lado avesso surgiu e determinou o lado certo de toda trajetória até este momento de fevereiro de 2021.
Hoje as lembranças são com ações, claro ,  lentas , o palco da vida insiste nas recompensas adquiridas pelas  décadas de lutas , buscas e travessias, balada de Gisberta  e quantos outras abomináveis mortes desnecessárias  como estas da covid 19 , de  urgência , agora, só a vacina!

 
rosinha minha canoa
em hilda hilst

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

QUARENTA E UM ANOS, VINTAGE ! ROSA MARIA DAÓLIO

 



Quarenta e um anos do partido dos trabalhadores , quando todos os políticos e milicos diziam que um  partido não tem futuro se começar pelo chão de fábrica ,  o momento é de dar forças ao pmdb de tancredo neves , montoro  e o professor  fhc em são paulo como senador , meu  Brasil  seguiria  com Sarney , Collor e  conviver com  os  45 escândalos do Governo fhc.

  Olha aí,  há quatro décadas estou aqui, meio que afogada pelos crimes cometidos pela  farsa jato , pela derrubada de uma presidenta  com  4,5 % de  taxa de desemprego , gaz  a 30 reais  e  a gasolina é nossa assim como  pré-sal, mas  tudo isso ficou no passado recente, hoje entregue  aos governos do Canadá, China, Noruega  e U.S.A.

E tem um  bobo da corte no poder  gritando,  viva a pandemia !

Isolamento , mascara e álcool em gel  e  pra disfarçar   fui lavar meu carro como antigamente, não é fusca 77 , sim um uno 2001 , completando vinte anos como eu em 77, meu partido 41, ora  vou reviver um tempo  que o sábado era de expectativa, depois da faculdade   a noite corria , coloquei no computador hits  dos anos 70 , mas eu  saboreava muito mais  chico, alcione, gil, raul , fafá de belém ,  milton carlos  com a loirinha gotinha d'água.Imagina eu de coração apaixonado?

 Hoje me sinto pertencida com  às varias  vergonhas alheias, pois eles fazem  chacota de gente morta , fazem arminha pra eleger um déspota, negam a ciência , negam  a cultura e cultuam  padrões  abjetos para captura do capital público, mas da minha audácia não abro as  mãos, em punhos,  avanço às situações difíceis  e transponho o estabelecido.

 E  os  dispositivos  de gênero e as  emocionalidades   que  me esquentam a cuca, transtornam meus sentimentos, desnudam as escolhas, porém, não é hora de problematizar e sim respirar. Parabéns Partido dos Trabalhadores !

rosinha minha canoa